19 março 2011

E sou mais líquido que sólido



Fui embora da festa divertida, porque o salão estava mal iluminado e o som me parecia demasiado alto para um espaço tão pequeno. E me cansa um pouco o trabalho que dá achar alguém na escuridão. Quando estou conversando frente a frente, gosto de privilegiar também o que os olhos dizem, mas luz naquele lugar era algo racionado ou em falta. Resolvi sair pela tangente, porque percebi que não era de bebida que meu corpo precisava e sim de carinho. E provavelmente naquele mundo de gente, o que as pessoas queriam mesmo era apenas dançar.
Carinho só pode ser oferecido por aquela pessoa que possui e acho que ninguém ali tinha carinho pra me oferecer, pelo menos não no tempo em que estive por lá, porque várias vezes me deixaram falando sozinho enquanto eu ainda estava na metade do assunto. Mas eu também entendi que é pedir demais que as pessoas estejam tão atentas a mim em pleno sábado a noite. E parece que é isso que o futuro nos reserva: cada um na sua própria bolha de ar...
 Eu não sou holofote nem tenho a pretensão de ser. Preferi deixar cada um em seu espaço dançando em sua vibe alucinada. Eu realmente não sei de onde eles tiram tanta energia e sorrisos de plástico, mas eu fico feliz por eles, porque eu os amo. Talvez todos estivessem mesmo felizes ou então estavam tão tristes e solitários de si que a solidão fazia seu movimento brusco e eu interpretava como dance. Acho mesmo é que estou ficando velho e careta...
 A menina, agora solteira, balançava sua saia hippie em movimentos sensuais, o guri exibia seu corpo fabricado pela malhação. A amiga já um pouco alta tinha um material de tarô nas mãos, o amigo dizia que preferia estar em silêncio tomando café, fumando um cigarro e sentindo o cheiro de um bom incenso. A quase graduada dizia que não queria ter filhos, porque a destruição da humanidade pelas mãos do homem é inevitável e o garoto lá no canto dançava como se soubesse que o fim da existência humana fosse acontecer no próximo instante.
Tudo é tão líquido que nada parece ficar em meus dedos. Tudo se esvai em pequenos fragmentos no compasso da melodia alegre. E as bocas se beijam sem se reconhecerem, os olhos se olham, mas parecem não se encontrar e tudo vai passando como passa os dias na folha do calendário. Eu permaneço parado tentando entender a delicadeza desses momentos em que o silêncio tem a mesma importância das palavras. E do lado de fora as pessoas já não se falavam, elas simplesmente berram coisas que eram impossíveis de se entender.
Então eu resolvi ir embora, porque eu não tinha o direito de estar ali subjugando os meus. Fui embora, porque às vezes tantas teorias acumuladas me fazem querer explodir de inquietação. Me retirei do salão sem dramas e despedidas  porque cansei de me forçar. Cansei de rir de piadas que não tinham a menor graça e minha dignidade me dizia que era hora de eu me respeitar. Fui embora principalmente porque mesmo não sabendo onde eu queria estar, tinha a certeza que não era ali.

Mazes