Há um tempo atrás
Condenado a te amar de cabeça pra baixo, é assim que eu me sinto todas às vezes que faço o mesmo percurso por onde você passa pelo menos duas vezes seguidas, indo de lá pra cá, só pra ter a certeza que o destino nunca esteve mesmo a nosso favor. Então fico por horas largado num canto a esperar a poeira assentar e eu encontrar finalmente a cura pra teus encantos. Esse teu jeito sem jeito de me colocar a todo instante a prova. Um jeito de diluir todos os meus planos de menino moço que quer crescer, ser gente grande, pagar imposto, ter cartão de crédito, conhecer Portugal.
Passo horas a construir avenidas iluminadas por onde eu sei que todos os casais um dia irá passar menos eu e você, já que agora nem mais o teu olhar eu vejo, embora eu possa descrever com mínimos detalhes toda tua anatomia, anatomia a qual eu nunca possuí, mas sei o cheiro que tem. Eu sei o gosto que é te pertencer em noites de frio e nuvens carregadas no céu dessa cidade estática. Sim, porque com certeza não tem mais pra onde essa cidade crescer e as planícies verdes que ainda existem, no fim das contas são só planícies. Mato morto, porque é só isso o que toda essa variação de temperatura tem feito, maltratado nossa esperança de um futuro melhor.
E me confundo no azul que tem meu caminho, dou risadinhas para quem passa – me servindo como um prato vulgar - e escondo no bolso minha solidão de homem pós moderno. E quando finalmente eu não te espero mais, você me aparece com a cara mais lavada do mundo e fica fazendo malabarismos pra tentar explicar que existe uma possibilidade, ainda que remota, de um dia podermos ser – ser aquilo que o amor quiser.
Mas que amor é esse que nunca ousa alçar vôo, hem? Que idade você pensa que eu tenho? Sim, porque se pra você a vida não passa e teu corpo não sente os efeitos do tempo, em mim esse mesmo tempo tem passado como um furacão ou um raio arisco, arrastando tudo o que tem encontrado pelo caminho. E te digo de coração verdadeiro – é pouco tudo o que me resta nesse instante em que brinco de ser escritor.
Se o teu coração não para, se teus passos não se confundem e se você não perde a noção de direita e de esquerda quando eu passo, que sorte a sua! Se tua boca não seca e se não te dar vontade de me amarrar em corrente e me deixar trancado no quarto ao seu bel prazer, sorria, você tem sorte. O amor realmente não te quis – Não te escolheu pra receber a glória que é passar os dias colhendo palavras bonitas para presentear alguém.
E que prazer você tem em me ver sempre assim tão nu? Tão despido de toda minha lógica e de todo meu bom senso. Tão a mercê e a espera de coisas fugitivas que insistem em nunca chegar a ser. Por que você não pode fazer o favor de passar uns tempos em outro país ou fazer uma viagem pra dimensões mais evoluídas do que a que eu no momento estou a pisar? Por que não me avisou que mordia, que era covarde, que achava divertido causar dor no outro, que gostava apenas de fazer graça e que não sabia falar o que sente? E por que tenho que ser eu a expulsar da minha vida todas as pessoas que eu penso que amo, só porque você não é capaz de aceitar essa porra de amor de você finge não sentir, finge não ligar, prefere esconder ou sublimar, reprimir ou recalcar.? E pra que te servem toda a sabedoria se teus olhos nem ao menos emana raios de serenidade?
Todas as calçadas ainda insistem em me levar pra tua cama, mesmo quando eu sei que tu és barco que gosta do mar e que nunca vai pensar na possibilidade de transformar nosso amor em uma ilha apenas habitada por nós dois... E eu vou ficando nesse cenário triste enquanto acendo um cigarro e encho essa cara barbuda com um vinho barato e vagabundo, navegando dentro de mim mesmo como um barquinho de papel navegando no mar frio em noites de temporais. Tentando buscar uma essência que me parece tão utópica e ineficaz que me dá preguiça de continuar na lida. Insistir em trilhar um caminho que no final das contas podem dar em nada.
Eu sou na verdade nada e enxergo o mundo por lentes abstratas demais, além de ter a certeza absoluta e irrevogável que sou urgente. Talvez seja essa minha mania de querer ir sempre na frente que atrapalhe tudo e faça com que meus sapatos me pareçam demasiados ultrapassados pra meu mundo contemporâneo, mas o que eu pretendia mesmo dizer nessas frases demoradas é que infelizmente eu não sou tão racional como era de se esperar... Eu confesso em letras destacadas: Estou com saudade de você.
É, sei que agora todo meu discurso foi por água abaixo. Mas de uma forma que eu realmente não entendo, essa nossa barreira intransponível precisa ter um fim... porque existe um parte de mim que necessita continuar te amando mesmo que seja na distância, mesmo que não seja direito, mesmo que os valores não permitam, mesmo que eu padeça e passe a fazer todo dia a besteira de te amar mais, mas é que a cada hora que passa fica mais difícil ir embora. Fica mais difícil fazer você entender que eu preciso ir. Então please, baby! Deixe-me seguir em frente. Te ganhando ou te perdendo, mas me deixe seguir. Eu preciso.
Mazes
Depois ele cantou pra mim, só pra mim: Você Não Sabe Amar - João Gilberto
2 comentários:
E se eu te dissesse que este foi o texto mais urgente teu? Tanta inconstância e tanta possibilidade de projetar/fracassar o amar é tão natural.
Sem palavras. Delicadeza Pura!
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